Meu artigo de hoje no diário Incentivo:
MESSIAS, SEM SOLUÇÃO, CULPA SÃO PEDRO
Só mesmo a saída da proposta de Orçamento de Estado para 2015 poderia fazer esquecer a confusão da colocação de professores. Aquela colocou todas as forças não apoiantes do Governo à procura de argumentos para dizer mal do documento e o problema do concurso do Ministério da Educação passou a chão que já deu uvas ou foi para a gaveta enquanto a nova discussão tiver sumo para espremer. É que isto da indignação das oposições para com vítimas de um erro ou injustiça de quem exerce o poder é mais vezes por interesse do partido do que por verdadeira solidariedade para com os prejudicados.
Não sou perito em contas a não ser à maneira do velho merceeiro do deve e haver, as únicas que davam sempre certo e não precisavam da engenharia financeira moderna para inventar verdades sobre o estado das finanças da mercearia. Mas dá para perceber que em casa onde não há pão todos ralham e ninguém tem razão e como Portugal durante décadas vendeu todas as joias que havia e até empenhou aquelas que dizia que um dia viria a ter, como nas parecerias público-privadas; hoje, não só nem há dinheiro para contentar a todos, como já nem dá para penhorar o quer que seja. Logo todos se revoltam com a migalha que tocou ao vizinho em detrimento do seu saco e ninguém está contente. Apenas há as custas das dívidas e juros para distribuir e destas ninguém quer, nem sabe como pagar.
Todavia é interessante ouvir um mesmo partido que não apresenta soluções, com a desculpa de que ainda é cedo para as mostrar, disfarçando assim a sua ignorância sobre o que fazer, dizer em simultâneo que o facto de o Governo colocar o défice acima do acordado com a troika revela eleitoralismo e o não baixar os impostos é uma insistência na austeridade, enquanto ele mesmo não se compromete com uma descida da carga tributária. Só que quando se está em estado de graça ou na oposição as contradições não são alvo de crítica e a necessidade de esperança num messias perdoa com facilidade as contradições e as omissões.
Contudo, quando se está no poder tem-se mesmo de assumir um remédio e não se pode dizer que não há solução para um problema como fez Presidente de Câmara de Lisboa, atribuindo ainda as culpas a São Pedro pelas inundações na Capital. Infelizmente, o que aconteceu naquela cidade foi o fruto do acumular de erros ao longo dos anos, tanto na gestão urbanística, como na falta de obras de saneamento básico. É que por lá também reinou a ideia de que as obras debaixo do chão não davam votos e meteu-se o projeto de escoamento de águas pluviais na gaveta e agora surge a desculpa da maré cheia para as ruas inundadas. Para messias ficou mal tal postura ou é já a máscara a cair?
A António Costa recomendo-lhe uma viagem a Amesterdão, onde chove que se farta e grande parte da cidade está sempre a uma cota mais baixa que o mar e a água escoa em melhores condições, mas é verdade que estas declarações ficaram impunes pelo estado de graça que ainda atravessa.
É verdade que os erros passados na falta de obras e no urbanismo em Lisboa não foram, na sua maioria, da responsabilidade do atual elenco camarário, tal como a culpa do estado de falência a que a nação chegou também não foi do atual Governo, mas a este ninguém lhe perdoa o facto de não resolver bem o problema e imaginem só que ele se contentasse em dizer que o País não tem solução ou que a culpa era de uns Judas que tinham hipotecado Portugal à custa dos Portugueses.
Espero que se chegar ao Governo de Portugal, perante a crise e a falta de dinheiro que existe, António Costa não tenha a tentação de dizer que o problema não tem solução pois os cofres estão vazios e não há dinheiro. Suspeito que então depressa o seu estado de graça desapareça, mas todos vão continuar a exigir aquilo que as finanças do País não têm para dar, mas que tacitamente ele não o diz para poder ganhar as próximas eleições.
Tudo é fácil quando há dinheiro ou se está na oposição sem a responsabilidade de gerir e decidir. O problema é quando se chega ao poder e este está falido. Propor a solução de crescimento económico e de investimento público sem dinheiro para isso é uma ilusão messiânica, só possível a quem faz milagres e não é culpando os santos que se consegue a intercessão destes.